Quando, no contexto da já propalada “Partilha das Quintas” sugeri o tema da Revolução de Mentalidades, de facto, no momento não me apercebi da amplitude do mesmo. Debruçando-me sobre o mesmo, pensei que, inicialmente, poderia iniciar a abordagem do tema começando por recorrer à etimologia da palavra, todavia, considerei mais oportuno indagar-me sobre a real necessidade de implementar uma Revolução de Mentalidades quando, ao longo da história, temos inúmeros marcos que nos demonstram que revoluções, sempre houve. Ressalte-se o exemplo do Maio de 68, o Apartheid na África do Sul, o 25 de Abril de 1974, a própria introdução do uso da mini-saia por Mary Quant…
O dealbar do novo milénio tem-se revelado turbulento e ameaçador, fazendo-nos conviver diariamente com o recrudescimento dos conflitos bélicos, o fantasma da crise económica, o medo do terrorismo internacional, o pântano da pedofilia, o quadro negro dos atentados ambientais e o extremar da intolerância e dos fundamentalismos. Pragas de proporções bíblicas que nos fazem temer pelo futuro das gerações vindouras e pela própria sobrevivência da espécie, enquanto nos confrontam com a face mais odiosa da condição humana...
No nosso cantinho do Atlântico, salvo localizadas excepções, continuamos felizmente imunes a muitos dos aterradores pesadelos que assolam o planeta. Continuamos a viver alegremente um dia após o outro, em confortável contemplação de umbigos, o nosso e o alheio, ou não fosse a bilhardice o eterno passatempo regional. Lá vamos pautando o nosso quotidiano pela mediania, nivelados pela baixa intriga política, espantados pela hilariante inércia da oposição e hipnotizados por doses industriais de novelas telecopiadas, reality-shows e noticiários de faca e alguidar...
Talvez seja a hora de perguntar: como vai a Alma Portuguesa? Que é feito do "povo humilde, estóico e valente" ? Agora que o progresso e o desenvolvimento se tornaram uma realidade, imperfeita e não isenta de críticas, mas inegável, não será tempo de nos virarmos para a mudança das mentalidades...?
Vivemos tempos difíceis, com elevados níveis de stress, salários a preço de saldos, objectivos de produtividade, trânsito intenso, endividamento excessivo, filas intermináveis nos correios, nas consultas, nos transportes, nos semáforos, nos bancos, nos serviços públicos, e esta amálgama de contrariedades tem ajudado a moldar o Selvagem Superior que, em maior ou menor grau, existe em cada um de nós...
De facto, nas estradas e nos Shoppings, de carro ou a pé, de dia e de noite, do mais modesto assalariado ao mais influente Sr. Doutor, da simples dona de casa ao exigente Administrador, cada vez são mais os exemplos reiterados de egoísmo, falta de civismo, irresponsabilidade, indiferença, prepotência e desrespeito pelo próximo. Junte-se a isto a sensação de impunidade, o compadrio e o nepotismo firmemente instalados, e temos a moldura perfeita da Selva Nacional...
Bem sei que um ser humano melhor não pode ser fabricado por decreto, mas também tenho por certo que algo deve ser feito e, neste contexto, proponho que seja encetado um ambicioso programa de alterações curriculares nas escolas do país. Assim, disciplinas como Educação Cívica, Prevenção e Segurança Rodoviárias e até mesmo Boas Maneiras, deveriam tornar-se obrigatórias desde a Instrução Primária, funcionando como um autêntico Primeiro Ciclo de Humanização para as novas Gerações. Ideias fascizantes, dirão os do costume, que confundem liberdade com irresponsabilidade; utopia, pensarão os pobres materialistas conformados que há muito deixaram de sonhar; disparate, julgarão os autómatos situacionistas que acham tudo bem como está. Mas, meus caros, imaginem como seria se apostássemos nestas primeiras gerações do milénio para transformar Portugal num melhor sítio, com melhores pessoas, e a partir daqui começar a mudar o Mundo...? Faça-se a Revolução das Mentalidades e dê-se Lugar ao Sonho...
Letícia Pinto